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Folha Gastronômica

Heranças gastronômicas dos papas

Ainda sob o impacto da morte de Papa Francisco e a escolha do novo Papa, Leão XIV, cumpre lembrar algumas descobertas gastronômicas nascidas nas cozinhas dos Papas. No Vaticano, em Roma, ou em Avignon, na França – quando Clemente VI, em 1348, comprou, aquela cidade, por 80 mil florins de ouro, à rainha Joana de Nápoles. Aqui seguem algumas dessas invenções:

  • Cozinhar em banho-maria – é cozinhar no fogo, ou no forno, utilizando-se dois vasilhames: um, para o alimento propriamente dito (que não fica em contato direto com o fogo); e outro maior, que contem água em quantidade suficiente para, ao ferver, não entrar no vasilhame do alimento. O processo recebeu esse nome em homenagem à famosa alquimista Mīriām (em aramaico Maryam ou Mariam, daí vindo Maria).  Em seus experimentos, usava ela esse processo – o kerotakis, uma espécie de barril fechado, com vapor, para aquecimento lento e gradual dos experimentos em vez de manipular as substâncias diretamente no fogo. Assim era possível controlar melhor a temperatura. Foi lendo alguns de seus manuscritos, guardados por Zósimo de Panópolis, que um dos primeiros cozinheiros dos papas resolveu experimentar seu processo com alimentos. Sucesso absoluto. Sendo a ela ainda atribuída a descoberta do alambique, do ácido clorídrico e do “axioma de Maria” – em que explica os quatro elementos formadores do mundo (o fogo, o ar, a terra e a água) – “o Um se torna Dois, o Dois se torna Três, e do terceiro nasce o Um como Quarto”. Muito mais complicado do que o universal banho-maria. 
  • Gratinar – uma técnica de cobrir o alimento, cru ou cozido, com molho branco e queijo ralado (parmesão, gruyère ou muçarela); após o que é levado ao forno para criar crosta e dourar. O processo foi usado pela primeira vez com legumes, colocando brasa na tampa das as. Essa técnica tem suas raízes na culinária sa (gratin) depois se espalhou por diversas culturas. Hoje, costuma-se gratinar sobretudo massas (lasanha, macarrão, nhoque, panquecas, ravióli), legumes e peixes (e outros frutos do mar).
  • À milanesa – método de cobrir aves, carnes, peixes ou legumes com ovo batido, em seguida ados na farinha de rosca, antes de ser fritos. No fim se forma uma crosta, dourada e crocante. A receita nasceu, na cozinha do Vaticano, sem um nome específico. Depois, não se sabe quando nem porque, ou a ser conhecida como à milanesa – sem que sua procedência tenha vindo de Milão. O mesmo que se deu com a salada russa, que não veio de Moscou; e com fritas sas, que nasceram bem longe da Gália.
  • Molho Bechamel – um molho cremoso e salgado, preparado com farinha de trigo, pimenta, noz-moscada, manteiga e leite quente. É base de vários pratos salgados. Foi invenção dos cozinheiros Pitti e Strozzi – que serviram aos papas e à poderosa família dos Médicis. Recebeu, no início, nome de balsamella. Depois esse molho foi aperfeiçoado por La Varenne na corte de Luís XIV, e acabou homenageando o general financista Louis de Béchameil (1630-1703). Mais tarde Antoine Carême modificou a receita original e ficou como a conhecemos hoje. Com o nome de béchamel sauce béchamel.  
  • Queijo Muçarela – um queijo de textura firme, com sabor suave e cremoso. Nasceu na região da Campânia, perto de Nápoles. No início, com leite de búfala, depois também com leite de vaca. É preparado pelo método de pasta filata – que se obtém ao aquecer a coalhada em água quente, até que ela se torne elástica e forme cordões. Estes cordões são então enrolados “em bola”, para serem depois cortados e moldados. Foi apresentada ao mundo por Bartolomei Scappi (1500-1577), cozinheiro de seis papas, que ou a utilizar o queijo em muitas de suas receitas.
  • Molho Bolonhesa – Mais uma invenção de Bartolomei Scappi, que preparou para Papa Paulo III (1500-1577) um espaguete com carne amassada, cebola e ervas (ainda não havia tomate, acrescentado à receita quase um século depois). O Sumo Pontífice ficou encantado. Em Parma, tem o nome de molho Farnese (em homenagem à influente família italiana que governou o ducado de Parma) – por não se aceitar, por lá, a falsa origem bolonhesa que acabou dando nome ao prato. 
  • Molho Verde – também chamado de molho Vaticano. Na receita muito ovo cozido picado, alho e salsinha. Invenção de um cozinheiro suíço que não deixou seu nome na história. Um dos preferidos dos papas, especialmente João Paulo II – que sempre o pedia em pratos de peixe.
  • Ovos Beneditinos – ovo poché sobre bacalhau desfiado e coberto de creme. Invenção do cozinheiro do Papa Bento XIII (1724-1730). No início esse Papa se denominou Bento XIV – por ser supersticioso e temer o número 13. Depois, acabou convencido a trocar de número. Nos Estados Unidos existe o eggs benedict, criado no restaurante Delmonico (1920), que nada tem com a receita original. Nessa receita americana, é torrada com ovos cozidos, cobertas com fatias de lombo canadense, normalmente servidos nos brunchs.
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