Alíria Costa: Não podemos mais itir que as salas de primeira infância sejam um ambiente assistencialista
Entrevistamos a presidente da associação dos Auxiliares de Desenvolvimento Infantil de Recife (ASSADIR), Alíria Costa. Ela nos contou um pouco sobre a atuação e os desafios à frente da instituição e a luta para o reconhecimento pedagógico da categoria.
Pergunta Papo de Primeira
Alíria, explica um pouco mais pra gente o que é a ASSADIR e sua atuação.
A ASSADIR é a associação dos Auxiliares de Desenvolvimento Infantil. Ela nasceu quase que ao mesmo tempo em que os primeiros ADIs ingressaram na Rede Municipal de Recife. Ela tinha o propósito de trazer organização, planejamento e defender os interesses da categoria.
Com o ar do tempo, ela foi se tornando algo mais. Ela é o símbolo da união e construção da nossa identidade como categoria e como educadores. É um instrumento que busca canalizar a nossa militância, o nosso ativismo nas causas referentes a educação, fundamentalmente com relação a Primeiríssima Infância.
Pergunta Papo de Primeira
Quais as prioridades de luta para esse ano?
Temos muitos desafios. A Pandemia trouxe muitas reflexões e um novo pensar sobre a Educação Infantil.
Precisamos, como educadores, como auxiliares dos professores, nos reinventar junto com eles. Isso exigiu que nós utilizássemos toda a nossa bagagem profissional e toda nossa criatividade, revelando o quanto faz diferença profissionais habilitados, capacitados para atuar junto a um setor tão importante e tão sensível para uma sociedade.
É por isso que não é mais possível conceber que uma capital como Recife possa ainda ter educadores sem a exigência de uma formação mínima para atuar nas Salas de Educação Infantil e os professores merecem e necessitam de uma equipe pedagógica pronta para auxiliá-los em todo o seu planejamento. Ou seja, nosso Reconhecimento Pedagógico é urgente!
Mas essa luta não está isolada, ela está dentro de um projeto maior, que visa transformar a cidade em um lugar que acolhe e constrói cidadania desde o útero materno. Foi com esse pensamento e esse foco que buscamos participar ativamente da construção do Plano Municipal da Primeira Infância (PMPI). Nosso reconhecimento está previsto nesta Lei. É uma das metas. Mas como dissemos anteriormente, somos ativistas da Primeira Infância e a nossa luta é pela implementação do plano como um todo. É por nossos bebês, por nossa cidade, por nós. Esse plano é nosso e vamos defendê-lo.
No entanto, aliada a essa nossa luta que já perdura por quase 15 anos, nos deparamos com algo extremamente crítico: o direito à vida! Neste momento estamos sendo obrigados a voltar para as salas de aula sem termos tomado a 2° dose da vacina. Na nossa função, é fundamental o contato, o acolhimento, para que possamos desenvolver a confiança e o apego seguro junto aos nossos Bebês. Ou seja, para que o nosso trabalho possa ser realizado, não existe protocolo porque teremos contato físico, teremos contato com os fluídos corporais das criancinhas, elas não estarão de máscara, sendo assim, duas das 3 medidas orientadas pela OMS, que são a utilização se máscara e distanciamento social não irão ocorrer. E eles necessitarão, mais do que nunca, do nosso colo para serem aninhadas e acalentadas num processo de adaptação, que será duríssimo. E em plena pandemia, com uma variante tão letal em circulação, o fato de voltarmos sem a menor segurança está adoecendo a categoria! Os profissionais estão desenvolvendo moléstias de toda ordem.
Sendo assim, ao lado do nosso Reconhecimento Pedagógico, do Plano Municipal da Primeira Infância, estamos lutando por nossas vidas.
São lutas hercúleas, mas estamos prontos para não desistir de nenhuma delas.
Alíria Thaisa com crianças na creche escola | Arquivo Pessoal
Pergunta Papo de Primeira
O que significa o “reconhecimento pedagógico”?
O Reconhecimento Pedagógico significa que nenhum profissional de sala de aula poderá exercer a função sem a qualificação mínima exigida pela Lei de Diretrizes e bases da Educação, a LDB. Para ficar mais claro: dentro da saúde existem os enfermeiros e os auxiliares de enfermagem (técnicos), é exigido desses técnicos cursos e formação específica para que possam auxiliar os enfermeiros na nobre tarefa de, junto aos médicos, salvarem vidas.
Pois bem, na educação não pode ser diferente. Não se pode falar de educação sem falar dos magníficos professores, eles são o sustentáculo de qualquer país sério. No entanto, na Educação Infantil não é possível, para eles, desenvolverem seu trabalho sozinhos, precisam de uma equipe. Nós somos essa equipe. Ou seja, não é possível falar de educação Infantil sem falar do ADI.
Não podemos mais itir que a salas de primeira infância sejam um ambiente assistencialista, nós entendemos o papel social da creche, mas ela é fundamentalmente uma instituição de ensino, e como tal, não é concebível que nas salas de aula da base da educação da nossa cidade, qualquer pessoa atue. Educação se faz com educadores formados e qualificados, valorizar o ADI é valorizar a Primeira Infância.
Pergunta Papo de Primeira
Na visão de vocês, o que seria uma educação infantil de qualidade?
Uma educação infantil de qualidade pera por uma visão, por um projeto multidisciplinar, que envolva toda a cidade, todo o poder público. Não adianta pensar na creche como um local fechado em si mesmo e que o processo de educação está ali. Precisamos desconstruir e reconstruir a cidade.
Um dos motores de toda essa transformação é a valorização dos profissionais da educação. Essa valorização pera não apenas pela questão salarial, cujo valores seguem sendo achatados e ínfimos para a importância do nosso papel social, muitos precisam de jornadas triplas de trabalho, e sendo mulheres, jornadas quádruplas com suas tarefas domésticas. Mas também incentivo a qualificação, condições dignas de trabalho, canal aberto de diálogo junto as instâncias de decisão e fundamentalmente, pelo respeito.
No entanto, é preciso, em primeiro lugar, que a sociedade e o poder público entendam que a creche, a escola se trata de um ambiente educacional. Por muito tempo, e ainda persiste, a visão assistencialista, que a creche é um direito da família e não da criança. Isso acontece porque falta a essas famílias, e fundamentalmente a essas mães, que em sua maioria são solos, políticas públicas afirmativas e, de fato, a presença do Estado.
Reconhecemos que uma das magníficas consequências das creches é a possibilidade dessas mulheres poderem trabalhar, estudar, mudar a realidade de sua família enquanto seus filhos estão seguros nas creches. Mas como disse, isso é uma consequência e não o objetivo da instituição.
Por isso, defendemos que todas as crianças em idade de creche tenham seu direito à vaga na assegurado, independente da condição econômica, mas claro, priorizando aquelas em vulnerabilidade. Essa escola de educação infantil, nome que imaginamos ser o mais correto, precisa ser pública e gratuita. E para essas mães, verdadeiras guerreiras, é preciso que cheguem junto à secretária da assistência social, secretaria da mulher, secretaria de finanças... que a Prefeitura dê e para elas de maneira a garantir seu crescimento, um presente e um futuro melhor dando aos nossos bebês condições para o seu amplo desenvolvimento e seu bem estar.
A creche não consegue abarcar tudo isso, porque o nosso foco são os bebês e as crianças pequenas. Os profissionais de educação precisam ser todos extremamente qualificados e focados no processo de ensino-aprendizagem, mas acabamos sendo cobrados para solucionar todos os problemas sociais. É muita coisa e a educação sozinha não dá conta. A Escola precisa ser vista como parceira na organização e no planejamento da sociedade e não como apêndice político.