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Despedida

Morre Dorinha Duval, aos 96 anos; atriz deixou TV após ser condenada por assassinato do marido

Informação foi confirmada em post nas redes sociais pela filha, a também atriz Carla Daniel, fruto de relacionamento com Daniel Filho

A atriz Dorinha Duval, conhecida por interpretar a primeira Cuca do "Sítio do picapau amarelo", faleceu nesta quarta-feira (21), aos 96 anos. A informação foi confirmada pela filha, a também atriz Carla Daniel, fruto de relacionamento com Daniel Filho, em post nas redes sociais.

Dorinha, que também se destacou como uma das irmãs Cajazeiras na novela "O bem-amado", deixou a vida artística após uma tragédia na vida pessoal. A atriz foi condenada pelo assassinato do então marido, o produtor publicitário Paulo Sérgio Garcia Alcântara.

O caso ocorreu na madrugada de 5 outubro de 1980, quando a atriz disparou três tiros contra seu marido durante uma briga que seria publicamente esmiuçada a partir de então.
 

Segundo matéria do Acervo O Globo, foi a própria artista que ligou a amigos pedindo ajuda para o marido. Mais tarde, enquanto Paulo Sérgio era operado no Hospital Municipal Miguel Couto, na Gávea, Dorinha, muito abalada, saía de cena. Sem saber que o marido morrera na mesa de cirurgia, foi para a casa de um amigo e só se entregou à polícia dois dias depois.

Entre goles de água com açúcar e crises de choro, apresentou uma versão que a acabou transformando, aos olhos de muita gente, também em vítima. Aos moldes de Doca Street, que assa quase quatro anos antes a pantera Ângela Diniz, alegando defesa da honra, em outro caso que mobilizou a opinião pública, Dorinha dizia ter sido ferida física e moralmente. Atirara em legítima defesa, garantia ela.

A briga teria começado dentro do quarto do casal, numa casa no Jardim Botânico. Dorinha e Paulo Sérgio tinham acabado de voltar de uma festa no Leblon. Saíram cedo, por volta de meia-noite, porque a atriz tinha um compromisso no dia seguinte em Belo Horizonte. Quando arrumava a mala para a viagem, num quarto ao lado, Dorinha ouviu o marido chamá-la diversas vezes. Ao encontrá-lo só de cueca, deitado, imaginou que a insistência era porque ele queria fazer sexo. Em depoimento à polícia, ela contou que foi para a cama, mas que, ao tentar abraçar Paulo, foi repelida. Detalhou também como foi o diálogo que precipitou a tragédia:

— Você é uma velha, não quero mais nada com você — teria dito Paulo, de 35 anos, a Dorinha, de 51.

Mesmo humilhada, a atriz teria tentado contornar a situação e agradar ao marido. Disse que poderia se submeter a uma plástica.

— Não adianta plástica, eu gosto de menininha nova, não quero uma bruxa remendada — teria continuado Paulo, ando a agredir Dorinha com chutes e tapas.

A atriz contou que pediu ao marido que parasse de agredi-la, ameaçando se matar.

— Ótima ideia, o revólver está ali — ele teria retrucado, apontando para a arma que comprara meses antes, por causa de um assalto do qual fora vítima na porta de casa.

A partir deste ponto, Dorinha dizia que era tudo uma névoa:

— Peguei o revólver e, a partir daí, não me lembro de nada, até quando o vi ensanguentado, caído no chão.

Enquanto amigos da atriz insistiam que ela era explorada pelo companheiro, amigos dele apontavam que ela possuía um ciúmes possessivo.

Levada a julgamento três anos depois, a artista teve sua história explorada no tribunal. Seu advogado, Clóvis Sahione, evocou um ado repleto de traumas afetivos, listando um a um: estuprada aos 15 anos, aos 18 se encantou por um trapezista de circo que, mais tarde, a abandonou. O júri ouviu as testemunhas de defesa de Dorinha — o humorista Chico Anysio e o ator Paulo Goulart, por exemplo, atestaram o caráter pacífico da atriz.

No fim, foi estipulada uma pena de um ano e meio de detenção, a ser cumprida em liberdade, já que a artista, que havia sido casada com Daniel Filho e tinha uma filha, a hoje atriz Carla Daniel, era ré primária e de bons antecedentes.

Como o promotor recorreu, Dorinha foi levada a novo julgamento em 1989. Mais uma vez, os jurados foram condescendentes. A atriz foi condenada a seis anos de reclusão em regime semiaberto, o que era a pena mínima para homicídio simples. Tinha o dia livre e precisava apenas dormir na prisão, em Niterói. Afastada da TV, virou artista plástica.

Em 2002, a ex-atriz publicou a biografia “Em busca da luz: memórias de Dorinha Duval”, escrita pelo jornalista Luiz Carlos Maciel e pela publicitária Maria Luiza Ocampo.

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