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Futebol

Mbappé x PSG: o que se sabe sobre disputa milionária e guerra judicial entre jogador e clube francês

Conflito de longa data entre um dos maiores atletas do mundo e o maior clube de futebol da França se transformou em uma verdadeira guerra jurídica

Parecia o casamento perfeito: o melhor jogador da França brilhando pelo clube de sua cidade natal. E, por um tempo, foi.

Kylian Mbappé era a grande estrela ao redor da qual o Paris Saint-Germain, principal time da França, planejava construir seu futuro. Seus donos, um braço do governo do Catar, o trouxeram de volta a Paris vindo do Monaco, em 2017, por cerca de 200 milhões de dólares, um valor recorde para um adolescente e, na época, a segunda maior transferência da história do futebol.

Gols foram marcados, títulos conquistados, Mbappé se tornou um dos atletas mais famosos do mundo, e a ligação entre jogador e clube parecia inabalável. Então, começaram os problemas.

Mbappé, agora com 26 anos, sonhava desde a infância em jogar pelo Real Madrid — a realeza do futebol — e teve sua grande chance em 2022, quando seu contrato estava prestes a expirar. No fim, ele decidiu ficar, mas apenas após um esforço monumental que envolveu até a intervenção do presidente da França, Emmanuel Macron, e o que o clube afirma ter sido o contrato mais lucrativo do futebol europeu.

Mas, tão rápido quanto as coisas se encaixaram, começaram a desmoronar. Mbappé deixou Paris após apenas duas temporadas, um ano antes do que se entendia como o prazo final do contrato. Sua saída desencadeou uma amarga disputa legal, com Mbappé acusando seu ex-clube de assédio e exigindo o pagamento de 55 milhões de euros (cerca de 61 milhões de dólares) que afirma serem devidos a ele.

O Paris Saint-Germain, por sua vez, se recusou a pagar, alegando que Mbappé havia feito um acordo verbal para abrir mão desse dinheiro e sair em bons termos com o presidente do clube e emissário do Catar no futebol global, Nasser al-Khelaifi.

Essa disputa oferece um raro vislumbre do mercado global de talentos no futebol, colocando um dos atletas mais influentes do mundo contra um pequeno, porém poderoso e riquíssimo, país do Golfo Pérsico. O Catar emergiu, na última década, como um dos maiores protagonistas do esporte mundial, usando seus investimentos para elevar seu perfil e sediar a Copa do Mundo de 2022.

Em uma coletiva de imprensa incomum na quinta-feira, em Paris, os advogados de Mbappé anunciaram que haviam intensificado suas ações, entrando com processos em várias instâncias. Eles pediram a um tribunal que congelasse parcialmente as contas bancárias do PSG para garantir o pagamento devido ao jogador e solicitaram à federação sa de futebol que impedisse o clube de disputar a Liga dos Campeões.

“O clube não está acima da lei, e a lei está do lado do jogador”, declarou Thomas Clay, um dos advogados de Mbappé.

O Paris Saint-Germain rejeitou as alegações, chamando-as de “mais um enredo fantasioso de um universo paralelo”.

Ruptura dolorosa
Após se tornar o jogador que o PSG acreditava que seria a base do time, a vontade de Mbappé de permanecer em Paris não durou muito. O fascínio de Madrid e o peso de um sonho de infância foram irresistíveis.

Menos de um ano depois de renovar com o PSG, Mbappé comunicou ao clube que queria sair como agente livre, recusando-se a exercer a opção de estender seu contrato por mais uma temporada. A revelação foi especialmente difícil para os torcedores, pois, quando Mbappé concordou em ficar em 2022, vestiu uma camisa com “2025” estampado nas costas, dando a entender que estava comprometido até aquele ano.

A saída de Mbappé em 2024 não apenas privou o PSG de um talento geracional, mas também da chance de recuperar os 180 milhões de euros pagos ao Monaco por sua contratação em 2017.

O clube tentou encontrar uma solução com Mbappé, oferecendo duas alternativas que permitiriam sua saída sem grandes prejuízos financeiros.

A primeira opção envolvia uma renovação de contrato com uma cláusula garantindo sua venda para outro clube — obviamente, o Real Madrid — caso um valor de nove dígitos fosse pago. A segunda opção exigia que Mbappé renunciasse a dezenas de milhões de euros em salários e bônus, totalizando 55 milhões de euros, para sair como agente livre sem gerar perdas para o PSG.

Os contratos foram elaborados, mas nunca assinados, e o PSG descreveu os acordos como um “pacto de cavalheiros” entre Mbappé e Al-Khelaifi.

O entendimento logo se transformou em um conflito. Mbappé acusou o PSG de assédio depois de anunciar sua saída, incluindo tê-lo deixado de fora de uma turnê de pré-temporada. O PSG, por sua vez, questionou a integridade do jogador ao descobrir que a carta oficializando sua decisão de não ativar a extensão contratual estava datada de julho de 2022 — apenas algumas semanas após ter reafirmado seu compromisso com o time.

As autoridades do futebol francês sugeriram uma mediação para resolver o ime, mas isso ainda não aconteceu.

Luta demorada
Em uma sala de conferência no 10º andar de um hotel, com a Torre Eiffel ao fundo, quatro advogados de Mbappé detalharam, na quinta-feira, os processos que abriram nos últimos dias em tribunais esportivos, civis e criminais, após esperarem por mais de um ano que o PSG buscasse um acordo.

Segundo seus advogados, Mbappé estava cansado de esperar pelo dinheiro que acredita ser seu por direito e também das versões imprecisas sobre sua situação contratual. A explicação da advogada de longa data do jogador, Delphine Verheyden, foi direta: Mbappé tinha um contrato, e o PSG não o cumpriu.

Ela e os outros advogados também descreveram como dirigentes do clube pressionaram Mbappé — ameaçando deixá-lo no banco por uma temporada e prejudicando sua reputação — para convencê-lo a uma alteração contratual que beneficiaria financeiramente o PSG e ajudaria a preservar sua imagem caso ele saísse.

O PSG condenou a coletiva de imprensa, acusando Mbappé de rejeitar “uma solução amigável” e de se recusar a levar o caso a um tribunal trabalhista. Um dos advogados de Mbappé rebateu, afirmando que esses casos costumam levar anos para serem resolvidos.

Fortemente abalado por toda a saga, o PSG decidiu nunca mais basear sua estratégia em torno de um único jogador, por mais talentoso ou famoso que ele seja.

Essa nova postura — que representa uma mudança em relação à abordagem adotada desde o início da era catariana, em 2011 — parece estar funcionando. O time tem sido elogiado por atuar de forma mais coletiva e está bem posicionado para realizar o sonho de seus donos de vencer a Liga dos Campeões, o maior título do futebol europeu, após derrotar confortavelmente um adversário inglês no primeiro jogo das quartas de final, na última quarta-feira.

Um reencontro com Mbappé no torneio pode ter que esperar. Seu novo time, o Real Madrid, sofreu uma surpreendente derrota por 3 a 0 contra o Arsenal, de Londres, no primeiro jogo de sua eliminatória, e agora precisará de uma reviravolta na partida de volta na próxima semana.

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