Ex-alunos brasileiros de Harvard criticam decisão de Trump de proibir matrícula de estrangeiros
Universidade americana entrou com uma ação judicial alegando a inconstitucionalidade da medida
O anúncio do presidente americano, Donald Trump, sobre a proibição de matricula de estrangeiros na Universidade Harvard provocou uma onda de reações negativas, incluindo entre ex-alunos brasileiros da instituição. Hoje em posições de liderança no Brasil, os outrora estudantes da universidade mais antiga e rica dos EUA listaram uma série de implicações prejudiciais em decorrência da medida, tanto para alunos quanto para o desenvolvimento científico e institucional da universidade, e direcionaram críticas ao governo americano. Harvard processou o governo nesta sexta-feira, alegando que a ordem é inconstitucional.
Economista e cientista político formado por Harvard, o secretário municipal de Educação do Rio, Renan Ferreirinha (PSD), afirmou em entrevista ao Globo que a troca de experiências entre alunos estrangeiros é uma característica que impulsiona o desenvolvimento da ciência não apenas na instituição, mas em todo o sistema universitário americano desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Proibir os pesquisadores estrangeiros, afirma, pode prejudicar iniciativas de ponta em temas que vão desde saúde pública até de estudos de formulação de princípios éticos.
— Quando acontece uma medida como essa em Harvard, incluindo o corte de verba de US$ 2 bilhões, afeta a cura do Alzheimer, que é uma área que é a universidade que está liderando no mundo. O que para são inúmeros avanços tecnológicos e a discussão moral sobre o uso da inteligência artificial — disse Ferreirinha.
Em um vídeo publicado nas redes sociais ao lado da deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP) — que também é formada em Harvard, em astrofísica e ciência política —, o secretário explicou que a decisão potencialmente afeta também alunos que já estão matriculados, uma vez que Trump retirou o direito de Harvard a certificação do programa de estudantes e visitantes de intercâmbio, um documento necessário para matrícula.
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— Na prática, o que essa decisão pode significar é que se alunos não pedirem transferência para outras universidades, terão seus vistos cancelados, sob risco de deportação — afirmou a deputada paulista no vídeo. — É um plano de vingança, uma retaliação, por Harvard ter se recusado a seguir ordens absurdas. Não aceitou recuar em políticas de inclusão. Não aceitou trocar sua liderança, mudar o seu currículo, silenciar o pensamento crítico.
O Departamento de Segurança Interna dos EUA (DHS) acusa a universidade de criar um ambiente inseguro no campus, ao permitir que "agitadores antiamericanos e pró-terroristas" assediassem e agredissem estudantes judeus, justificando que muitos dos agitadores seriam estudantes estrangeiros. A secretária Kristi Noem afirmou que a instituição de ensino fomenta "violência, antissemitismo e a coordenação com o Partido Comunista Chinês".
— É um privilégio, não um direito, que as universidades matriculem estudantes estrangeiros e se beneficiem de suas mensalidades mais altas para ajudar a aumentar suas dotações multibilionárias — disse a secretária de Segurança Interna.
Ainda no vídeo publicado na noite de quinta, Tabata faz críticas específicas ao argumento do governo americano sobre a matrícula de estrangeiros ser um privilégio, acusando Trump de fomentar o autoritarismo no país.
— Quando Trump diz que matricular um aluno estrangeiro é um privilégio, não o direito, ele dá mais uma amostra do seu autoritarismo, e ataca assim o maior dos valores ocidentais, que é a democracia — afirmou. — Um governo que usa a máquina do Estado para calar o diferente, para calar o divergente, qual que é o nome que a gente dá para isso?
Embora esteja sob pressão máxima do governo americano, Harvard decidiu nesta sexta-feira manter sua posição de não recuar às exigências de intervenção. O presidente interino da universidade, Alan M. Garber, comunicou que a instituição entrou com uma ação judicial no tribunal federal de Massachusetts, argumentando que a medida do governo viola seus direitos garantidos pela Primeira Emenda e pelo devido processo legal.
"Condenamos essa ação ilegal e injustificada", escreveu Garber em uma carta enviada à comunidade estudantil pela manhã. "Ela coloca em risco o futuro de milhares de estudantes e pesquisadores em toda Harvard e serve como um alerta para incontáveis outros estudantes em faculdades e universidades de todo o país que vieram aos Estados Unidos para buscar sua educação e realizar seus sonhos".
Na avaliação do ex-aluno e atual secretário de Educação do Rio, o posicionamento da universidade diante das tentativas de intervenção é motivo de orgulho.
— O que Harvard tem feito nos enche muito de orgulho, por manter essa posição coerente com seus quase quatro séculos de história. É um papel de liderança moral. Como o presidente Garber falou, a liderança moral tem um preço e no curto prazo pode até ter um um certo choque, mas é o que mantém instituições vivas, fortes e coerentes — afirmou.