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FEMINICÍDIO

Julgamento de PM que matou a esposa em Paulista acontece no dia 12 de junho; relembre o caso

Mãe da vítima conversou com a Folha de Pernambuco

Foi no início de janeiro de 2013 que a comerciante Yana Luíza Moura de Andrade, de 30 anos, foi morta pelo marido, o capitão da Polícia Militar de Pernambuco (PMPE) Dário Angelo Lucas da Silva, hoje com 51 anos.

Ele será julgado pela primeira vez no próximo dia 12 de junho, às 8h30, na 1ª Vara Criminal da Comarca de Paulista, na Região Metropolitana do Recife.

Yana morreu aos 30 anosYana morreu aos 30 anos | Foto: Cortesia

O feminicídio aconteceu no dia 2 daquele mês, uma quarta-feira, quando Dário efetuou dois tiros de pistola .40 contra a esposa. Os disparos atingiram o olho esquerdo dela.

O casal estava no apartamento da mãe de Dário, em Paulista. Segundo a mãe da vítima, Rozeane Moura, de 60 anos, eles viviam um relacionamento conturbado, e o ciúme excessivo fazia parte da rotina dos dois.

Traição

Rozeane contou à Folha de Pernambuco que Yana teria sido informada que Dário mantinha um relacionamento extraconjugal com uma mulher da cidade de Exu, no Sertão, com quem ele teria um filho de 7 meses, à época. Foi aí que os problemas no casamento teriam começado.

“Minha filha era muito apaixonada por ele. Os dois não tinham mais uma vida sexual ativa e ele dizia que, simplesmente, ela não era mais uma ‘novidade’ para ele”, frisou.

Histórico de agressão
Dário e Yana moravam juntos há 4 anos, em Ouricuri, também no Sertão do estado, e foram para Paulista junto com os dois filhos dela, para comemorar o Réveillon. Uma semana antes do crime, ele teria agredido a esposa, de acordo com a mãe dela.

“Ele espancou, deu uma coronhada na cabeça dela, bateu com a cabeça dela na cama e deu chute nela. Isso tudo eu soube depois. Uma pessoa [que morava perto do casal] que ligou para mim, não se identificando, e disse que eu tivesse cuidado com minha filha, porque ele ia matá-la. [Essa pessoa] tinha ouvido o grito dela pedindo socorro em casa”, contou.

Depois que escutou o relato, Rozeane diz ter ligado para a filha, que negou qualquer episódio de agressão. Yana era proprietária de um restaurante istrado pela mãe, em Paulista, e ou dois dias sem visitar o estabelecimento.

Yana deixou dois filhos | Foto: Cortesia

Rozeane foi visitá-la e desconfiou de que a filha estaria sendo espancada, ainda quando chegou à sala da casa dela.

“Quando eu cheguei lá, ela estava sentada no sofá. Como ela era muito vaidosa, estava maquiada, mas era perceptível a mancha roxa no rosto dela. Eu perguntei a ela, mas minha filha me disse que tinha sido um acidente no banheiro”, continuou.

Às vésperas do Réveillon da angústia
Como dito no começo do texto, o crime aconteceu no Réveillon de 2013. Poucos dias antes, entre 28 e 29 de dezembro de 2012, Yana ligou para a mãe e disse que aria a virada de ano com ela, em Ouricuri, como era a tradição da família. Ela e o marido costumavam ir à casa da sogra.

Casal estava junto há 4 anos | Foto: Cortesia

“Combinamos tudo, vimos o que íamos fazer. Estava tudo certo. Ela não ia mais viajar. Inclusive, os [dois] filhos dela tinham ido para Araripina, onde mora o pai dele. Quando foi dia 30 [de dezembro] pela manhã, ela ligou para mim dizendo que não ia [ar o Réveillon comigo], e que ia viajar com ele [Dário, o marido]. Eu já fiquei apreensiva. Pedi a ela para não ir. Ela disse que ia", relembrou.

"Antes de ir, pegou os filhos e foi no restaurante, só que ela não saiu do carro. Eu fui conversar com ela e notei um abatimento, uma tristeza. ‘Yana, por que que tu vai?’, eu perguntei. Ele [Dário] tinha saído para conversar com o advogado dele no restaurante. Quando ele viu que eu estava lá conversando com ela, ele correu e entrou dentro do carro, impedindo que a gente conversasse”, detalhou a mãe.

Separação e a morte
Durante a entrevista, emocionada, Rozeane relembra que recebeu uma ligação da filha, às 21h do dia 1º de janeiro daquele ano, dizendo que estava separada de Dário. Essa separação seria definitiva, segundo ela. A mãe aconselhou a filha a ir embora para Ouricuri, temendo que ela fosse assassinada, mas ela negou, pedindo para que a Rozeane não se preocue.

“Quando foi na madrugada, já umas 3h, eu recebi a ligação da mãe dele, contando que ele tinha matado ela. Ai, meu Deus, como é difícil falar sobre isso...”, desabafou, às lágrimas.

Foto tirada momentos antes do assassinato | Foto: Cortesia

Alicerce depois da tragédia
Yana era filha única de Rozeane. Hoje, a professora vê apoio para prosseguir, mesmo em meio ao luto, nos dois netos deixados pela filha. Eles, que são das idades de 19 e 21 anos, moram com o pai. “São filhos de um outro casamento que ela tem. Hoje, eu vivo por eles”, continua.

“Eu não tenho dúvida que ela foi coagida a ir para Paulista. Ela foi ameaçada. Ele levou para matá-la. Eu ouvi de uma pessoa, em ligação, que ele teria dito a ela que, se ela não fosse, iria no sítio do meu pai matar as pessoas que ela amava”, revelou Rozeane.

Promovido e aposentado
Cerca de 2 anos após o crime, em 29 de janeiro de 2015, Dário foi promovido a major e aposentado. A resolução foi publicada na edição do dia seguinte do Boletim Geral da Secretaria de Defesa Social (SDS). Hoje, ele é advogado, e Rozeane questiona como que ele pode exercer tal profissão, que, inclusive, era o sonho da filha dela, que era bacharel em direito.

“Ela estava estudando para tirar a carteirinha da OAB [Ordem dos Advogados do Brasil]. Queria ser advogada. Estava estudando para concurso, justamente para trabalhar na causa das mulheres. Ele roubou esse direito da minha filha de tirar a OAB, de ela seguir o sonho de ser delegada, e, hoje, ele é advogado. Eu queria ainda saber qual é o critério que a OAB usa para aprovar um réu confesso. Eu fico sem entender. Eu acho isso bizarro”, declarou.

Quando a mãe se refere a Dário como ‘réu confesso’, é porque ele se entregou à polícia, ainda no dia do crime, assumindo a autoria do feminicídio. Os filhos dela, que também estavam no apartamento, não chegaram a presenciar o assassinato da mãe.

Sentimento de justiça
Mesmo 12 anos após o crime, aquele dia fatídico continua pujante na memória de Rozeane. Ela vem ao Recife, no próximo dia 8, para resolver assuntos referentes ao processo. As expectativas da família são de que algo seja feito para punir o acusado de uma vez por todas. “Eu espero que a justiça seja feita”, acrescentou.

"Hoje, eu falo não apenas como mãe. Eu falo como uma mulher destruída, uma vida marcada pela dor que nenhuma palavra pode explicar. A minha filha — a minha menina, meu pedaço de alma — foi assassinada. Ela foi arrancada de mim por um ato covarde, brutal, que tem nome: feminicídio. Ela não morreu. Ela foi morta, foi silenciada, foi punida por ser mulher. E o pior: o culpado está solto, anda pelas ruas, respira o mesmo ar que nós, enquanto minha filha está debaixo da terra", lamentou ela.

Não aceito flores. Não aceito condolências vazias. Eu quero justiça. Quero que o nome dela não seja só mais um número nas estatísticas. Quero que a dor dela sirva de alerta, de grito, de mudança. Até quando vamos enterrar filhas, mães, irmãs, amigas", finalizou.

Com a palavra, a defesa
Ivaelio Mendes de Alencar, que é um dos advogados de defesa de Dário e tem escritório no Ceará, também foi procurado. Ele confirmou que o acusado exerce a advocacia e disse, por telefone, que vai consultar o cliente e os outros dois componentes da defesa para possível pronunciamento. Após essa conversa, se houver autorização, prometeu retornar o contato.

E a OAB-PE, o que diz?
A Ordem dos Advogados do Brasil de Pernambuco (OAB-PE) foi procurada pela reportagem e questionada sobre o registro do acusado e o exercício da profissão, mas ainda não se posicionou.

Não sofra!
Caso você, mulher, esteja sofrendo algum tipo de violência, denuncie, acionando a Central de Violência Contra a Mulher, através do 180.

A equipe oferece serviços como registros de denúncias, orientações para vítimas de violência e informações sobre leis e campanhas. Não se cale, denuncie.

Tipos de violência contra a mulher:

  • Física: quando há espancamento, lançamento de objetos, aperto dos braços, estrangulamento, sufocamento, lesões com objetos cortantes ou perfurantes, ferimentos causados por queimaduras ou armas de fogo e tortura;
  • Psicológica: quando há ameaças, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento (proibir de estudar e viajar ou de falar com amigos e parentes), vigilância constante, perseguição contumaz, insultos, chantagem, exploração, limitação do direito de ir e vir, ridicularização, falta da liberdade de crença, distorção e omissão de fatos para deixar a mulher em dúvida sobre a memória e sanidade dela (gaslighting);
  • Sexual: quando há estupro, obrigação à mulher a fazer atos sexuais que causam desconforto ou repulsa, impedimento do uso de métodos contraceptivos ou forçar a mulher a abortar, uso da força para o matrimônio, gravidez ou prostituição por meio de coação, chantagem, suborno ou manipulação e limitação e anulação do exercício dos direitos sexuais e reprodutivos da mulher;
  • Patrimonial: quando há controle do dinheiro, ausência no pagamento de pensão alimentícia, destruição de documentos pessoais, furto, extorsão ou dano, estelionato, privar de bens, valores ou recursos econômicos e provocação de danos propositais a objetos da mulher ou dos quais ela goste;
  • Moral: quando há acusação à mulher de traição, emissão de juízos morais sobre a conduta dela, críticas mentirosas, exposição da vida íntima, rebaixamento da mulher por meio de xingamentos que incidem sobre a índole dela e desvalorização da vítima pelo modo de se vestir.

Onde buscar ajuda
A Lei Maria da Penha estabelece que todo o caso de violência doméstica e intrafamiliar é crime, deve ser apurado por meio de inquérito policial e ser remetido ao Ministério Público.

A violência contra a mulher pode ser manifestada das seguintes formas: física, psicológica, sexual, patrimonial e moral.

Em todos os casos, lembre-se que você não está sozinha e pode fazer a denúncia de diversas formas. 

Veja como e onde receber acolhimento em caso de violência doméstica em Pernambuco:

Ligue de forma gratuita para o 190: Polícia Militar de Pernambuco (PMPE). O serviço é disponível 24h por dia, todos os dias. 

Ligue de forma gratuita para o 180: Central de Atendimento à Mulher. O serviço do Governo Federal fica disponível 24h por dia, todos os dias, e recebe ligações de todos os lugares do Brasil. Ele registra e encaminha denúncias de violência contra a mulher aos órgãos competentes.

Ligue de forma gratuita para o 0800.281.81.87: Ouvidoria da Mulher de PE. O serviço funciona até às 20h, depois desse horário é recomendado ligar para o 190.

A Polícia Civil de Pernambuco (PE) dispõe de 15 Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAM). Algumas delas funcionam 24h por dia. Confira as unidades:

Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAM)

- Recife (1ª Delegacia de Polícia da Mulher) PLANTÃO 24H
Endereço: Rua do Pombal, s/n, Praça do Campo, Santo Amaro.
Telefone: (81) 3184.3356 / 3184.3352

- Jaboatão dos Guararapes (2ª Delegacia de Polícia da Mulher) PLANTÃO 24H
Endereço: Rua Estrada da Batalha, s/n, Prazeres - 6º Batalhão.
Telefone: (81) 3184.3444 / 3184.7198.

- Petrolina (3ª Delegacia de Polícia da Mulher) PLANTÃO 24H
Endereço: Avenida das Nações, nº 220, Centro.
Telefone: (87) 3866.6625

- Caruaru (4ª Delegacia Especializada da Mulher) PLANTÃO 24H
Endereço: Rua Dalton Santos, nº 115, São Francisco.
Telefone: (81) 3719.9107 / 3719.9106

- Paulista (5ª Delegacia de Polícia da Mulher) PLANTÃO 24H
Endereço: Praça Frederico Lundgren, s/n, Centro
Telefone: (81) 3184.7075 / 3184.7077

- Cabo de Santo Agostinho (14ª Delegacia de Polícia da Mulher) PLANTÃO 24H
Endereço: Av. Conde da Boa Vista (antiga BR 101), S/N, Pontezinha.
Telefone: (81) 3184.3414 / 3184.3413

- Olinda (15ª Delegacia Especializada da Mulher) PLANTÃO 24H
Endereço: Avenida Governador Carlos de Lima Cavalcanti, 2405 - Casa Caiada.
Telefone: (81) 98663.6677

- Surubim (7ª Delegacia de Polícia da Mulher)
Endereço: Rua Santos Dumont, nº 85, Oscar Loureiro.
Telefone: (81) 3624.1983 / 3624.1984

- Goiana (8ª Delegacia de Polícia da Mulher)
Endereço: Rua 65, Loteamento Carvalho Feitosa, s/n, Centro.
Telefone: (81) 3626.8510

- Garanhuns (9ª Delegacia de Polícia da Mulher)
Endereço: Avenida Frei Caneca, nº 460, Centro.
Telefone: (87) 3761.8510/ (87) 3761.8507

- Vitória de Santo Antão (10ª Delegacia de Polícia da Mulher)
Endereço: Av. Henrique de Holanda, nº 1333, Redenção.
Telefone: (81) 3526.8789 / 3526.8928

- Salgueiro (11ª Delegacia Especializada da Mulher)
Endereço: Rua Antônio Figueiredo Sampaio, 93, no bairro Nossa Senhora das Graças.

- Afogados da Ingazeira (13ª Delegacia de Polícia da Mulher)
Endereço: R. Valdevino J. Praxedes, s/n, bairro Manoela Valadares
Telefone: (87) 3838.8713 / (87) 3838.8782

- Palmares (16ª Delegacia Especializada da Mulher)
Endereço: R. Cap. Pedro Ivo, 590 - Centro, Palmares

- Arcoverde (17ª Delegacia Especializada da Mulher)
Endereço: Rua Augusto Cavalcanti, 276 Centro da Cidade
Telefone: (87) 98877-2210

Serviços no Recife
A Prefeitura do Recife disponibiliza alguns serviços voltados para as mulheres vítimas de violência doméstica.

Centro de Referência Clarice Lispector
O local funciona 24h, todos os dias da semana, e conta com espaço para o abrigamento emergencial de usuárias em atendimento, acompanhadas ou não de filhos.

Endereço: Rua Doutor Silva Ferreira, 122, em Santo Amaro.

Serviço Especializado e Regionalizado - SER Clarice Lispector
O local acolhe mulheres em situação de violência, por meio de uma equipe multidisciplinar formada por duas assistentes sociais, duas advogadas, duas psicólogas e duas educadoras.

Endereço: Avenida Recife, nº 700, Areias.

Atendimento: 7h às 19h, de segunda a domingo 

Salas da Mulher
As Salas da Mulher de cada Compaz são responsáveis pelo primeiro acolhimento das cidadãs.

Unidades do Compaz: Eduardo Campos (Alto Santa Terezinha), Ariano Suassuna (Cordeiro), Miguel Arraes (Praça Caxangá), Dom Hélder Câmara (Coque) e o recém-inaugurado Paulo Freire (Ibura). 

Plantão WhatsApp (24 horas) para casos de violência doméstica: (81) 99488.6138.

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