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OPINIÃO

O Recife parou

A cidade do Recife está localizada em uma planície costeira plana, atravessada pelas bacias hidrográficas dos rios Capibaribe, Beberibe e Tejipió. Um dos maiores desafios do sistema de drenagem é a coincidência de chuvas intensas com a maré alta, que impede o escoamento adequado da água para galerias e canais. Essa situação não apenas compromete a mobilidade urbana, mas também impacta a saúde da população, especialmente de crianças e idosos em comunidades vulneráveis, onde os alagamentos são mais severos.

Outras cidades ao redor do mundo enfrentam desafios semelhantes, mas têm adotado soluções eficazes para mitigar os impactos das inundações. Lisboa, por exemplo, sofria com alagamentos frequentes devido às chuvas intensas e à sua topografia urbana. Para enfrentar esse problema, foram implementados reservatórios de retenção ("piscinões"), sistemas de bombeamento para deslocar águas de áreas baixas para rios e canais, e barreiras contra a maré alta para evitar a entrada excessiva de água nos sistemas de drenagem.

Outro exemplo inspirador é a Holanda, que, apesar de ter grande parte de seu território abaixo do nível do mar, se destaca como referência mundial em gestão hídrica. Desde o século XVII, os holandeses desenvolveram soluções inovadoras, como moinhos de vento que funcionavam como bombas mecânicas para drenagem, e os "polders" – áreas protegidas por diques e reguladas por sistemas de comportas. O sucesso da Holanda também se deve à criação dos Waterschappen (Conselhos de Água), que, desde o século XVIII, monitoram e mantêm as infraestruturas hídricas, garantindo uma gestão descentralizada e eficiente.

No Recife, as chuvas do início de fevereiro de 2025 praticamente paralisaram a cidade, causando prejuízos econômicos e sociais significativos. E isso aconteceu em apenas dois dias de chuva – imagine os impactos durante o período chuvoso, nos meses de junho e julho, quando o índice pluviométrico é ainda maior. Grande parte da infraestrutura de drenagem foi projetada no século ado e não acompanha o crescimento urbano desordenado e a crescente impermeabilização do solo, o que agrava o problema.

Durante minha experiência no segundo governo de Jarbas Vasconcelos à frente da Prefeitura do Recife, testemunhei sua preocupação com a drenagem urbana. O Projeto Nassau, implantado naquela gestão, conseguiu mitigar grandes alagamentos em áreas como Boa Viagem. No entanto, à época, o prefeito já mencionava a falta de engajamento da sociedade nesse tema tão crucial.

A solução para o Recife não exige a reinvenção da roda. É fundamental que os governos municipal, estadual e federal atuem de forma conjunta, buscando referências internacionais para desenvolver um sistema de drenagem eficiente e resiliente. É necessário investir em infraestrutura moderna, promover a manutenção constante das redes de drenagem existentes e engajar a população na discussão sobre gestão hídrica. Somente com planejamento estruturado e compromisso político poderemos minimizar os impactos das chuvas e garantir o desenvolvimento sustentável do Recife.


* Mestre em Engenharia Civil pela UFPE.

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