Olinda: patrimonial, líquida, conventual, carnavalesca, cultural. E descontinuada?
Gilberto Freyre disse: " Não se pode falar sobre Olinda esquecendo sua luz". A luz do sol. Que dá às águas do mar a riqueza de cor que nos encanta a todos. Os daqui e os de fora. No berço de Olinda, está o mar. E está o curso Jurídico, fundado em 1827. E que funcionou lá até 1854. Durante um tempo, um burgo universitário e eclesiástico. Depois, vieram as vocações modernas.
São três as vocações modernas de Olinda: a primeira é a vocação de patrimônio cultural, constituída no barroco conventual, de mosteiros e do casario. Tudo isto desenhado por Aloísio Magalhães. E apresentado à UNESCO. Em 14 de dezembro de 1982. Cuja certidão foi o título de cidade patrimônio, natural e cultural, da humanidade. Adornado na pintura de João Câmara, nas imagens de Augusto Rodrigues, na poesia de Carlos Pena Filho. E a invenção de Baccaro, o armorial de Samico, o rubro de Teresa Costa Rego. Os coqueiros de Zé Claudio, o brilho popular de Janete Costa.
A segunda vocação moderna de Olinda é o espírito político dos olindenses. Tão republicano, nas insurgências de 17,24 e 48. E tão aristocrático, nos modos e modas de sua população. Afeita à busca dos fazeres sociais. O republicanismo olindense é uma âncora que distinguiu a província e, então, a Federação, desde sempre. E o aristocratismo é um diploma que veio com açúcar. E, agora, ampliado no terciário de serviços turísticos.
A terceira vocação moderna de Olinda é a alma carnavalesca. E que mostra a notável capacidade de síntese do povo olindense. Seu talento para harmonizar o profano e o sagrado. Mesclar o sagrado e o profano. Numa sinfonia de sons e cores, percepção e invenção, aprendizado e maestria. Olindenses são discípulos que logo se tornam mestres. No sonhar e no exprimir. No dizer e no dançar. No frevar. Com as Virgens de Olinda, o Bacalhau do Batata, o Homem da Meia Noite, o Vassourinhas, o Elefante, o Pitombeiras, o Maracatu Nação Pernambuco. E tantos mais.
Olinda é patrimonial e líquida. Conventual e carnavalesca. Mas descontinuada? Por que não há uma política atemporal de preservação do patrimônio cultural de Olinda? Uma política continuada, apoiada numa lei de Plano Diretor, a ser observada pelos inquilinos da prefeitura? Uma política, uma lei, uma vontade, uma decisão. E a irrevogável determinação de garantir a Olinda a preservação de seus bens materiais. E o respeito aos bens imateriais. O maior deles, a própria Cidade. Como símbolo e expressão. Sonho e realização.
É preciso que Olinda não seja só o emblema brincante do Carnaval. Mas que represente o valor de uma obra-prima, que é, da cultura do povo olindense. Como se ouvisse o poema de Joaquim Cardozo: "Olho as palmeiras do velho seminário, o horto dos jesuítas, e neste mar distante e verde, neste mar numeroso e longo ainda vejo as caravelas ... ".
* Conselheiro do Conselho de Proteção do Patrimônio Cultural de Pernambuco.
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