Ucrânia lança seu maior ataque contra bases aéreas russas às vésperas de negociação do cessar-fogo
Mais cedo, Rússia realizou megabombardeio com drones contra base de treinamento militar ucraniana, matando ao menos 12 soldados e ferindo mais de 60
A Ucrânia lançou neste domingo seu maior ataque contra bases aéreas dentro da Rússia desde o início da guerra, uma operação coordenada que atingiu pontos de leste a oeste do país e deixou dezenas de aeronaves russas em chamas.
A ofensiva ocorreu às vésperas de os países se reunirem novamente em Istambul para tentar negociar um cessar-fogo, e no mesmo dia em que Moscou realizou um megabombardeio com drones contra uma base de treinamento militar ucraniana, matando ao menos 12 soldados e ferindo outros mais de 60.
Leia também
• Delegação da Ucrânia irá a Istambul na segunda-feira (2) para negociar com a Rússia
• Ataques russos deixam dois mortos na Ucrânia
Segundo o Ministério da Defesa da Rússia, os drones ucranianos atacaram aeródromos em cinco regiões que se estendem por cinco fusos horários. Várias aeronaves pegaram fogo em Murmansk, perto da fronteira com a Noruega, e Irkutsk, no leste da Sibéria, informou a Pasta, acrescentando que outros ataques foram repelidos e não houve vítimas.
O ataque em Irkutsk, na base aérea de Belaya, foi o primeiro ataque de drones ucranianos à Sibéria desde o início da guerra, em fevereiro de 2022. A base de Olenya, é um dos principais aeródromos estratégicos da Rússia, abrigando aeronaves com capacidade nuclear.
Os detalhes do comunicado do Ministério da Defesa russo não puderam ser verificados de forma independente.
O comunicado foi divulgado horas depois que um funcionário dos serviços de segurança da Ucrânia, conhecidos como SBU, disse sob condição de anonimato que uma operação em grande escala com drones estava em andamento, visando aeródromos em quatro regiões russas. Segundo ele, dezenas de aeronaves foram danificadas nos ataques.
Os meios de comunicação ucranianos relataram que mais de 40 aviões russos foram atingidos, incluindo uma aeronave de reconhecimento A-50 e bombardeiros estratégicos Tu-95 e Tu-22, capazes de lançar armas nucleares. Não foi possível confirmar imediatamente esses números.
Os danos representariam cerca de US$ 7 bilhões (aproximadamente R$ 40 bilhões, na cotação atual) e um duro golpe à capacidade nuclear russa, segundo estimativas ucranianas.
O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, disse que os ataques foram a operação de maior alcance lançada por seu país em território russo
— Trata-se de nossa operação de maior alcance — afirmou o presidente Volodymyr Zelensky neste domingo, detalhando que 117 drones foram usados, 34% dos quais atingiram o alvo designado, e que os agentes envolvidos na preparação do ataque conseguiram sair "a tempo" do território russo.
Fontes anônimas do SBU disseram que oficiais ucranianos transportaram secretamente drones para dentro do território russo usando caminhões que levavam chalés de madeira pré-fabricados.
Quando chegou a hora, os telhados dessas instalações foram abertos remotamente e os drones ativados para realizar o ataque, segundo relatos do jornal ucraniano Pravda, da agência estatal Ukrinform e da televisão pública Suspilne. A operação, com codinome "teia de aranha", foi preparada durante um ano e meio e supervisionada pelo presidente Zelensky, disseram.
"O mais interessante, e já podemos dizer isso publicamente, é que o 'escritório' da nossa operação em território russo estava localizado bem ao lado do FSB [o serviço de segurança] da Rússia, em uma de suas regiões", disse Zelensky no Telegram, descrevendo a operação como “um resultado absolutamente brilhante”. “Sem dúvida ficará nos livros de História”.
As afirmações não puderam ser confirmadas, mas o Ministério da Defesa da Rússia afirmou que os drones usados nos ataques a Murmansk e Irkutsk foram lançados nas imediações dos aeródromos. Segundo a Pasta, várias de suas aeronaves militares "se incendiaram" após o ataque e duas pontes em regiões fronteiriças com a Ucrânia desabaram. Os incidentes foram qualificados como "atos de terrorismo" por Moscou, sem acusar Kiev diretamente. Vários suspeitos foram detidos.
Os serviços ucranianos reivindicaram que a operação em "larga escala" afetou 41 caças russos usados para bombardear cidades ucranianas.
O meio de comunicação americano Axios publicou que Kiev havia informado previamente à Casa Branca sobre a operação. As informações de inteligência dos EUA foram determinantes durante os mais de três anos de guerra para que o exército ucraniano atacasse bases russas, detectasse o movimento de seus bombardeiros ou o lançamento de seus mísseis contra o seu território.
Blogueiros militares russos foram rápidos em declarar os ataques ucranianos um fracasso significativo das defesas da Rússia.
“Hoje será mais tarde chamado de um dia negro para a aviação de longo alcance russa”, dizia uma postagem no canal do Telegram chamado Fighterbomber, que se acredita ser istrado pelo capitão Ilya Tumanov, do Exército Russo. “E o dia ainda não acabou”.
A notícia do bombardeio foi recebida com júbilo por grande parte da sociedade ucraniana, com imagens do ataque sendo compartilhadas nas redes sociais e centenas de mensagens comemorando o fato. Uma das ideias mais repetidas entre essas mensagens é que o que aconteceu se assemelha à sabotagem que, em 2022, por meio de um caminhão-bomba, destruiu parcialmente a ponte de Kerch, a infraestrutura que conecta a Rússia à Crimeia, península anexada ilegalmente pelo Kremlin em 2014.
A vice-chefe do Gabinete presidencial da Ucrânia, Iryna Vereshchuk, disse que os serviços de segurança “estabeleceram um novo padrão de habilidade na condução de operações de combate em grande escala em território inimigo”.
“Isso não é um nocaute, mas um golpe muito sério para o inimigo”, escreveu Vereshchuk no Telegram.
No início deste domingo, as Forças Armadas da Ucrânia disseram que um ataque com mísseis russos a uma base de treinamento matou pelo menos 12 soldados e feriu mais de 60 outros — uma rara declaração reconhecendo baixas em suas fileiras.
O comandante das Forças Terrestres da Ucrânia, major-general Mykhailo Drapatyi, apresentou sua renúncia após o ataque à base, na região de Dnipro, afirmando em um comunicado que sentia uma “responsabilidade pessoal pela tragédia”.
“Um exército em que os comandantes assumem responsabilidade pessoal pela vida de seu povo está vivo. Um exército onde ninguém é responsabilizado pelas perdas morre por dentro”, declarou.
As Forças Armadas da Ucrânia afirmaram que estavam investigando as circunstâncias, mas enfatizaram que não havia uma aglomeração de pessoas no momento do ataque — uma aparente tentativa de demonstrar as lições aprendidas com incidentes anteriores.
— No momento em que o alerta de ataque aéreo foi anunciado, todo o pessoal estava em abrigos, exceto aqueles que podem não ter tido tempo de chegar até lá — comentou Vitalii Sarantsev, porta-voz das Forças Terrestres da Ucrânia, em entrevista à mídia ucraniana.
As Forças Armadas da Ucrânia normalmente não divulgam números oficiais de vítimas, que são tratados como segredo de Estado e são um tema altamente sensível no país. Ataques anteriores com um grande número de vítimas militares — como quando um míssil russo matou soldados reunidos para uma cerimônia de premiação no sul da Ucrânia no final de 2023 — levantaram questões sobre os protocolos de segurança.
Os ataques deste domingo ocorreram na véspera de mais uma rodada de negociações de paz em Istambul, proposta por Moscou. Embora Kiev tenha insistido em ver um memorando prometido delineando os termos do cessar-fogo da Rússia antes de enviar qualquer representante às negociações, o presidente Volodymyr Zelensky anunciou neste domingo que Kiev enviaria uma delegação.
Ele não disse se a Ucrânia havia recebido o memorando. Em uma postagem nas redes sociais, Zelensky afirmou apenas que se reuniu com a alta liderança e “definiu nossas posições” antes das negociações de segunda-feira em Istambul, onde o ministro da Defesa, Rustem Umerov, lideraria a delegação ucraniana.
A Turquia sediará a reunião, propiciada pela pressão do presidente americano, Donald Trump, para alcançar um acordo que ponha fim à guerra, iniciada há mais de três anos. Autoridades ucranianas acusaram o presidente Vladimir Putin, da Rússia, de ganhar tempo nas negociações.
Zelensky, que tinha expressado anteriormente seu ceticismo em relação à seriedade da parte russa sobre a reunião de segunda-feira, disse ter definido a posição da delegação ucraniana no encontro.
As prioridades são obter "um cessar-fogo completo e incondicional", assim como o "retorno dos prisioneiros" e das crianças que Kiev acusa Moscou de ter sequestrado, escreveu nas redes sociais.
Já Moscou disse ter suas próprias condições para a paz, mas se negou a divulgá-las de antemão. Putin descartou a proposta turca de realizar a reunião entre chefes de Estado.
Horas antes do ataque deste domingo à base de treinamento militar na Ucrânia, a Rússia também lançou o que autoridades ucranianas disseram ser o maior ataque aéreo combinado durante a noite ao país desde o início da guerra.
Segundo a Força Aérea da Ucrânia, a Rússia lançou 472 drones e sete mísseis durante a noite, tendo a maioria dos drones e três dos mísseis sido interceptados, apesar de pelo menos 18 alvos terem sido atingidos, segundo as autoridades.
Embora a Força Aérea não tenha fornecido mais detalhes sobre o que foi atingido, autoridades locais na região de Kiev disseram que pelo menos 10 casas sofreram danos. As autoridades locais também relataram danos na região de Kirovohrad, no centro da Ucrânia, e na região nordeste de Kharkiv.